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Mestres da Poesia - Fernando Pessoa. Fernando PessoaЧитать онлайн книгу.

Mestres da Poesia - Fernando Pessoa - Fernando Pessoa


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a paisagem ao morrer do dia.

      Liberdade

      Ai que prazer

      Não cumprir um dever,

      Ter um livro para ler

      E não fazer!

      Ler é maçada,

      Estudar é nada.

      O Sol doira

      Sem literatura.

      O rio corre, bem ou mal,

      Sem edição original.

      A brisa, essa,

      De tão naturalmente matinal,

      Como tem tempo não tem pressa...

      Livros são papéis pintados com tinta.

      Estudar é uma coisa em que está indistinta

      A distinção entre nada e coisa nenhuma.

      Quanto é melhor, quando há bruma,

      Esperar por D.Sebastião,

      Quer venha ou não!

      Grande é a poesia, a bondade e as danças...

      Mas o melhor do mundo são as crianças,

      Flores, música, o luar, e o sol, que peca

      Só quando, em vez de criar, seca.

      O mais do que isto

      É Jesus Cristo,

      Que não sabia nada de finanças

      Nem consta que tivesse biblioteca...

      Hora absurda

      O teu silêncio é uma nau com todas as velas pandas...

      Brandas, as brisas brincam nas flâmulas, teu sorriso...

      E o teu sorriso no teu silêncio é as escadas e as andas

      Com que me finjo mais alto e ao pé de qualquer paraíso...

      Meu coração é uma ânfora que cai e que se parte...

      O teu silêncio recolhe-o e guarda-o, partido, a um canto...

      Minha ideia de ti é um cadáver que o mar traz à praia..., e no entanto

      Tu és a tela irreal em que erro em cor a minha arte...

      Abre todas as portas e que o vento varra a ideia

      Que temos de que um fumo perfuma de ócio os salões...

      Minha alma é uma caverna enchida p’la maré cheia,

      E a minha ideia de te sonhar uma caravana de histriões...

      Chove ouro baço, mas não no lá-fora...É em mim...Sou a Hora,

      E a Hora é de assombros e toda ela escombros dela...

      Na minha atenção há uma viúva pobre que nunca chora...

      No meu céu interior nunca houve uma única estrela...

      Hoje o céu é pesado como a ideia de nunca chegar a um porto...

      A chuva miúda é vazia...A Hora sabe a ter sido...

      Não haver qualquer coisa como leitos para as naus!...Absorto

      Em se alhear de si, teu olhar é uma praga sem sentido...

      Todas as minhas horas são feitas de jaspe negro,

      Minhas ânsias todas talhadas num mármore que não há,

      Não é alegria nem dor esta dor com que me alegro,

      E a minha bondade inversa não é nem boa nem má...

      Os feixes dos lictores abriram-se à beira dos caminhos...

      Os pendões das vitórias medievais nem chegaram às cruzadas...

      Puseram in-fólios úteis entre as pedras das barricadas...

      E a erva cresceu nas vias férreas com viços daninhos...

      Ah, como esta hora é velha!... E todas as naus partiram!

      Na praia só um cabo morto e uns restos de vela falam

      De longe, das horas do Sul, de onde os nossos sonhos tiram

      Aquela angústia de sonhar mais que até para si calam...

      O palácio está em ruínas... Dói ver no parque o abandono

      Da fonte sem repuxo... Ninguém ergue o olhar da estrada

      E sente saudade de si ante aquele lugar-outono...

      Esta paisagem é um manuscrito com a frase mais bela cortada...

      A doida partiu todos os candelabros glabros,

      Sujou de humano o lago com cartas rasgadas, muitas...

      E a minha alma é aquela luz que não mais haverá nos candelabros...

      E que querem ao lago aziago minhas ânsias, brisas fortuitas?...

      Por que me aflijo e me enfermo?...Deitam-se nuas ao luar

      Todas as ninfas... Veio o Sol e já tinham partido...

      O teu silêncio que me embala é a ideia de naufragar,

      E a ideia de a tua voz soar a lira dum Apolo fingido...

      Já não há caudas de pavões todas olhos nos jardins de outrora...

      As próprias sombras estão mais tristes...Ainda

      Há rastos de vestes de aias (parece) no chão, e ainda chora

      Um como que eco de passos pela alameda que eis finda...

      Todos os ocasos fundiram-se na minha alma...

      As relvas de todos os prados foram frescas sob meus pés frios...

      Secou em teu olhar a ideia de te julgares calma,

      E eu ver isso em ti é um porto sem navios...

      Ergueram-se a um tempo todos os remos...pelo ouro das searas

      Passou uma saudade de não serem o mar...Em frente

      Ao meu trono de alheamento há gestos com pedras raras...

      Minha alma é uma lâmpada que se apagou e ainda está quente...

      Ah, e o teu silêncio é um perfil de píncaro ao sol!

      Todas as princesas sentiram o seio oprimido...

      Da última janela do castelo só um girassol

      Se vê, e o sonhar que há outros põe brumas no nosso sentido...

      Sermos, e não sermos mais!... Ó leões nascidos na jaula!...

      Repique de sinos para além, no Outro Vale... Perto?...

      Arde o colégio e uma criança ficou fechada na aula...

      Por que não há de ser o Norte o Sul?... O que está descoberto?...

      E eu deliro... De repente pauso no que penso...Fito-te...

      E o teu silêncio é uma cegueira minha...Fito-te e sonho...

      Há coisas rubras e cobras no modo como medito-te,

      E a tua ideia sabe à lembrança de um sabor de medronho...

      Para que não ter por ti desprezo? Por que não erde-lo?...

      Ah, deixa que eu te ignore...O teu silêncio é um leque -

      Um leque fechado, um leque que aberto seria tão belo, tão belo,

      Mas mais belo é não o abrir, para que a Hora não peque...

      Gelaram todas as mãos cruzadas sobre todos os peitos....

      Murcharam mais flores do que as que havia no jardim...

      O meu amar-te é uma catedral de silêncio eleitos,

      E os meus sonhos uma escada sem princípio mas com fim...

      Alguém


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