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O último comboio para a liberdade. Meg Waite ClaytonЧитать онлайн книгу.

O último comboio para a liberdade - Meg Waite Clayton


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      Quando o comboio parava, o menino pequeno aproximou-se da janela, gritando: «Mamã!»

      Truus tentou arranjar-lhe o cabelo enquanto seguia o seu olhar através do vidro manchado de neve: Os alemães em filas ordenadas na plataforma apesar da tempestade, um bagageiro com um carrinho cheio de malas, um homem curvado com um cartaz que anunciava um alfaiate. Sim, também lá estava a mulher que o menino via. Uma mulher magra, vestida com casaco escuro e um cachecol, de pé junto do carrinho das salsichas, de costas para o comboio, enquanto o menino a chamava novamente: «Mamã!!!»

      A mulher virou-se, dando uma trinca gordurosa à sua salsicha, enquanto levantava o olhar para os letreiros informativos da estação. O menino fez um ar triste. Não era a mãe, claro.

      Truus aproximou-o dela e sussurrou: «Já passou, já passou», incapaz de fazer promessas que não podia cumprir.

      As portas do vagão abriram-se com um assobio alto e muito barulho. Um guarda fronteiriço nazi da plataforma esticou o braço para ajudar uma passageira que saía do comboio, uma alemã grávida que aceitou a sua ajuda com uma mão enluvada. Truus desabotoou os botões de pérolas das suas luvas amarelas de couro e afrouxou os punhos ornados. Tirou as luvas e o couro prendeu-se num anel de rubi situado entre outros dois anéis enquanto, com mãos que já começavam a enrugar-se e a encher-se de manchas, limpava as lágrimas do rapaz.

      Arranjou-lhes o cabelo e a roupa, dirigindo-se a eles pelo seu nome, mas sem perder um segundo, atenta à fila minguante de passageiros.

      — Muito bem — disse, limpando a baba do bebé enquanto os últimos passageiros desembarcavam. — Vão lavar as mãos, como praticámos.

      O guarda fronteiriço nazi já estava a subir as escadas.

      — Vá lá, apressem-se, mas lavem muito bem as mãos — indicou Truus, com calma. E disse à menina: — Mantém os teus irmãos na casa de banho, querida.

      — Até voltares a calçar as luvas, Tante Truus — concluiu a menina.

      Era necessário que não parecesse que Truus estava a esconder as crianças, mas também não queria tê-las demasiado perto durante a negociação. «Não fixamos o olhar no que se vê, mas no que não se vê», pensou e levou inconscientemente o rubi aos lábios, como um beijo.

      Abriu a mala, algo mais delicado do que teria levado se soubesse que regressaria a Amesterdão com três crianças. Procurou no seu interior, tirando os anéis enquanto as crianças, agora atrás dela, se afastavam pelo corredor.

      À frente dela, apareceu o guarda fronteiriço. Era um homem jovem, mas não o suficiente para não ser casado ou para não ter filhos.

      — Vistos? Tem vistos para sair da Alemanha? — perguntou a Truus, a única adulta que restava no vagão.

      Truus continuou à procura na mala, como se fosse pegar nos papéis que lhe pedia.

      — As crianças podem ser difíceis, não é? — replicou, com amabilidade, enquanto tocava no seu passaporte holandês, ainda na mala. — Tem filhos, agente?

      O guarda ofereceu-lhe a ameaça de um sorriso.

      — A minha esposa está grávida do nosso primeiro filho. Talvez nasça no dia de Natal.

      — Que sortudos! — exclamou Truus, sorrindo devido à sua sorte enquanto o guarda olhava para onde se ouvia o barulho da água a correr e as crianças a tagarelar. Deixou que o homem assimilasse aquela ideia: Em breve, teria um bebé, tal como o pequeno Alexi, que cresceria até se transformar num jovem como Israel ou a sua querida Sara.

      Truus brincou com o rubi, reluzente e quente no anel solitário que usava.

      — Imagino que tenha algo especial para a sua esposa, para celebrar a ocasião.

      — Algo especial? — repetiu o nazi, devolvendo-lhe a sua atenção.

      — Algo bonito para que possa usar todos os dias, para recordar um momento tão especial. — Tirou o anel e acrescentou: — O meu pai ofereceu isto à minha mãe no dia em que nasci.

      Com dedos firmes e pálidos, ofereceu-lhe o anel de rubi, juntamente com o seu passaporte.

      O jovem aceitou apenas o passaporte, examinou-o e olhou novamente para a parte traseira do vagão.

      — São seus filhos?

      As crianças holandesas podiam incluir-se nos passaportes dos pais, mas, no dela, não aparecia nenhuma.

      Virou o rubi para que refletisse a luz e disse:

      — As crianças são o mais prezado que existe.

      RAPAZ CONHECE RAPARIGA

      Stephan saiu pela porta e desceu os degraus cobertos de neve a correr, com a mochila a bater contra o casaco da escola enquanto corria para o Burgtheater. Parou perto da papelaria: A máquina de escrever continuava lá, na montra. Puxou os óculos pelo nariz, colou os dedos ao vidro da montra e fingiu escrever.

      Continuou a correr, abrindo caminho entre a multidão de Christkindlmarkt, com o cheiro do vinho quente com especiarias e do pão de gengibre, dizendo: «Desculpe, desculpe! Desculpe!», com o gorro puxado até às orelhas para evitar que o reconhecessem. A família era boa: A sua riqueza provinha da empresa de chocolates fundada com o seu próprio dinheiro e mantinham as suas contas na sucursal de Haber do Banco Rothschild. Se chegasse aos ouvidos do pai que empurrara outra idosa na rua, aquela máquina de escrever continuaria a estar mais perto da árvore de Natal de Rathausplatz do que da árvore que tinham na sala de inverno em casa.

      Cumprimentou o idoso do quiosque de imprensa.

      — Boa tarde, herr Kline!

      — Onde deixou o seu casaco, jovem Stephan? — perguntou o idoso.

      Stephan olhou para baixo — voltara a deixar o casaco na sala de aula —, mas só diminuiu a velocidade quando chegou a Ringstrasse, onde um protesto nazi bloqueava o caminho. Dirigiu-se para a entrada do metro, coberta de cartazes colados, e desceu os degraus metálicos para a escuridão do mundo subterrâneo vienense, para sair depois pelo lado da rua onde era o Burgtheater. Atravessou as portas do teatro e desceu os degraus de dois em dois até à barbearia da cave.

      — Jovem Neuman, que bela surpresa! — exclamou herr Perger, arqueando as sobrancelhas brancas por trás dos seus óculos, tão pretas e redondas como as do próprio Stephan, embora menos sujas de neve. O barbeiro baixou-se e apanhou com a pá os últimos bocados de cabelo daquele dia. — Mas cortou o cabelo recentemente…

      — Só um corte rápido. Já passaram semanas.

      Herr Perger endireitou-se e atirou os cabelos para o lixo. Depois, pousou a vassoura e a pá junto de um violoncelo apoiado na parede. «Enfim, a memória não é tão rápida numa mente idosa como numa mente jovem, imagino», comentou, com carinho, apontando com a cabeça para a cadeira. «Ou talvez não seja tão rápida na mente de um jovem com dinheiro a mais.»

      Stephan deixou cair a mochila da escola e algumas páginas da sua nova peça espalharam-se pelo chão, mas o que importava? Era apenas herr Perger. Tirou o casaco, acomodou-se na cadeira e tirou os óculos. O mundo tornou-se impreciso, o violoncelo e a vassoura pareciam um casal a dançar a valsa num canto e a cara que aparecia no espelho por cima do laço poderia ser a cara de qualquer pessoa. Tremeu quando herr Perger o cobriu com a capa. Stephan não gostava nada dos cortes de cabelo.

      — Ouvi dizer que vão começar os ensaios de uma nova peça — comentou. — É do Stefan Zweig?

      — Ah, sim, és um grande admirador do herr Zweig. Como pude esquecê-lo? — redarguiu Otto Perger, troçando, de certo modo, com Stephan, mas com carinho. Além disso, herr Perger conhecia todos os segredos dos dramaturgos, das estrelas e do teatro. Os amigos de Stephan não sabiam de onde tirava todos os seus exclusivos. Pensavam que conhecia alguém importante.

      — A mãe do


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